1/25/2008

É bonito isso?

"Bom estar com Baudelaire, brincar com Baudelaire, deixar correr solto o que a gente quiser. Em qualquer faz de conta, a gente apronta, é bom ser moleque enquanto puder. Ser super-humano, boneco de pano, menino menina que lê Baudelaire... Doce, doce, doce a vida é um doce..."


Le Monstre ou Le paranymphe d'une nymphe macabre

Tu n'es certes pas, ma très-chère,
Ce que Veuillot nomme un tendron.
Le jeu, l'amour, la bonne chère,
Bouillonnent en toi, vieux chaudron!
Tu n'es plus fraîche, ma très-chère,

Ma vieille infante! Et cependant
Tes caravanes insensées
T'ont donné ce lustre abondant
Des choses qui sont très-usées,
Mais qui séduisent cependant.

Je ne trouve pas monotone
La verdeur de tes quarante ans;
Je préfère tes fruits, Automne,
Aux fleurs banales du Printemps!
Non! tu n'es jamais monotone!

Ta carcasse a des agréments
Et des grâces particulières;
Je trouve d'étranges piments
Dans le creux de tes deux salières;
Ta carcasse a des agréments!

Nargue des amants ridicules
Du melon et du giraumont!
Je préfère tes clavicules
A celles du roi Salomon,
Et je plains ces gens ridicules!

Tes cheveux, comme un casque bleu,
Ombragent ton front de guerrière,
Qui ne pense et rougit que peu,
Et puis se sauvent par derrière
Comme les crins d'un casque bleu.

Tes yeux qui semblent de la boue,
Où scintille quelque fanal,
Ravivés au fard de ta joue,
Lancent un éclair infernal!
Tes yeux sont noirs comme la boue!

Par sa luxure et son dédain
Ta lèvre amère nous provoque;
Cette lèvre, c'est un Eden
Qui nous attire et qui nous choque.
Quelle luxure! et quel dédain!

Ta jambe musculeuse et sèche
Sait gravir au haut des volcans,
Et malgré la neige et la dèche
Danser les plus fougueux cancans.
Ta jambe est musculeuse et sèche;

Ta peau brûlante et sans douceur,
Comme celle des vieux gendarmes,
Ne connaît pas plus la sueur
Que ton oeil ne connaît les larmes.
(Et pourtant elle a sa douceur!)

Sotte, tu t'en vas droit au Diable!
Volontiers j'irais avec toi,
Si cette vitesse effroyable
Ne me causait pas quelque émoi.
Va-t-en donc, toute seule, au Diable!

Mon rein, mon poumon, mon jarret
Ne me laissent plus rendre hommage
A ce Seigneur, comme il faudrait.
"Hélas! c'est vraiment bien dommage!"
Disent mon rein et mon jarret.

Oh! très-sincèrement je souffre
De ne pas aller aux sabbats,
Pour voir, quand il pète du soufre,
Comment tu lui baises son cas!
Oh! très-sincèrement je souffre!

Je suis diablement affligé
De ne pas être ta torchère,
Et de te demander congé,
Flambeau d'enfer! Juge, ma chère,
Combien je dois être affligé,

Puisque depuis longtemps je t'aime,
Etant très-logique! En effet,
Voulant du Mal chercher la crème
Et n'aimer qu'un monstre parfait,
Vraiment oui! vieux monstre, je t'aime!


E lá vai a tradução do Junqueirinha:

O MONSTRO OU O PADRINHO DE UMA NINFA MACABRA

Sei que não és, minha querida,
O que Veuillot chama de botão.
O jogo, o amor, a boa vida,
Fervem em ti, meu caldeirão!
Não és mais jovem nem garrida,

Ó velha infanta! E todavia
As tuas caravanas fúteis
Deram-te o lustro e a serventia
Das coisas que, conquanto inúteis,
Sempre seduzem todavia.

Nunca me causam tédio ou sono
Os teus quarenta (ou os que tiveras);
Prefiro os teus frutos, outono,
À floração das primaveras!
Jamais me deste tédio ou sono!

Tua carcaça tem encantos
E singulares harmonias;
No oco dos ombros há recantos
Onde degusto especiarias;
Tua carcaça tem encantos!

Despreza as pessoas ridículas
Que amam a abóbora e o melão!
Prefiro o teu pr de clavículas
Aos ossos do rei Salomão,
E odeio as pessoas ridículas!

Tua juba, azul capacete,
Sombreia-te a fronte voraz,
Que pouco cora e não reflete,
E após se alonga para trás
Nas crinas do azul capacete.

Teus olhos que lembram a lama,
Onde cintila algum fanal,
Vivos ao ruge que os inflama,
Dardejam um brilho infernal!
Teus olhos negros como a lama!

Pela luxúria e o fel do riso,
Teu lábio amargo nos instiga;
Este teu lábio é um paraíso
Que nos seduz e nos fustiga.
Quanta luxuria no teu riso!

Tua perna robusta e aérea
Move-se à borda dos vulcões,
E em que pese a neve e a miséria,
Dança o cancã das ilusões,
Tua perna robusta e aérea;

A pele seca e já sem graça,
Como as que murcham e descoram,
Até do suor se fez escassa
E os olhos vítreos já não choram.
(E todavia ela tem graça!)

Ingênua, vais direta ao Diabo!
Contigo iria, de bom grado,
Se esta medonha pressa, ao cabo,
Não me deixasse emocionado.
Vai-te sozinha, pois, ao Diabo!

Meu rim, meu pulmão, meu jarrete,
Nada me deixa honrar, enfim,
A este Senhor; como compete.
"O que é uma lástima, ai de mim!"
Dizem meu rim e meu jarrete.

Mais do que eu sofro ninguém sofre
Por não poder ir aos sabás
E ver, quando ele solta o enxofre,
O imundo beijo que lhe dás!
Mais do que eu sofro ninguém sofre!

Pôs-me o Demônio em aflição
Por não servir-te de guarida
E por pedir-te demissão,
Tocha do inferno! Vê, querida,
Quanto me custa essa aflição,

Pois uma vez que há muito te amo,
Sempre razoável, procurando
Do Mal a essência que proclamo
E a um único monstro adorando,
Então, de fato, ó monstro te amo!

Como diz uma grande amiga minha, pára tudo e chama a NASA. Baudelaire me ama.

6 comentários:

rose marinho prado disse...

Chocante o poema. Mas quero ler amanhã...

Forte...

Mas ele se refere a uma mulher mais velha...Já com 20 você achava que era pra você o poema?
Calculou e fez tudo para chegar à maturidade do jeito que o diabo , não, o Baudelaire gosta(va)?

Amanhã lerei mais e escreverei mais. Sua personalidade está à vista neste poema mediúnico...e atravessador dos tempos.

Marie Tourvel disse...

Cê viu como sou fria e calculista? Me preparei pros 40 desse jeito mesmo. Sempre achei que Baudelaire era meio Mãe Dinah. Mas acho que poucos tem o gosto de Baudelaire, né não? Minha personalidade, meu caro ou cara, não chega aos pés de um vale-coxinha.

rose marinho prado disse...

Comparar Baudelaire à Mãe Dinah?????


Caramba!


Não entendi...

gosto de Baudelaire é

a - o texto dele tem sabor?
b- o corpo dele tem ( tinha né?)sabor?
c- as pessoas gostam do que Baudelaire gostava


Não precisa me responder. Volto aqui, depois de ter lido melhor o poema. Confesso que tirante Fleur du Mal...não li outra coisa de Baude. É maravilhoso mas sempre me deu um certo medo. Então, fiquei nas flores apenas.

Até

Marie Tourvel disse...

Mas o poema faz parte das Flores do Mal, embora deveria ser das Flores do Bem, claro. Deveria ter falado do "bom gosto" de Baudelaire. Se pensou em mim mais madura -para não dizer velha, desse jeito, só pode ter bom gosto.;)Leia, leia Baudelaire e não precisa ter medinho. É delicioso. Um abraço.

rose marinho prado disse...

Baudelaire revisitado? Boa!

Marie Tourvel disse...

Pois é, Rose. Revisitado e meu, só meu... hahahaha. Adorei que veio neste meu post antigo. É um dos posts que mais gosto, querida. Adoro quando vem ao Letras... Beijos.