2/14/2009

Obvious

Ela andava francesa, escocesa, inglesa, portuguesa, italiana... Mas descobriu uma palavra para se designar. Era naturalmente óbvia. Era tão óbvia que feria aos olhos. Quando "certos" liam suas obviedades faziam aquela feição de nojinho. Sabem? Aquela que sente vergonha alheia. Alguns queriam desesperadamente apagar seus escritos, mas não podiam fazê-lo de forma que não deixasse rastro. Alguns simplesmente a chamavam horror. Alguns sentiam o que ela sentia, mas, obviamente, não podiam deixar transparecer. Era melhor deixar isso no inconsciente. Afinal, obviedade não fica bem perante ao clube, à confraria. Ela sabia que atraía os tais "certos", mas eles desistiam para que os outros membros não os considerassem óbvios. Secretamente, então, a liam para que em alguns momentos sentissem a sensação do óbvio, do sentimento rasgado e escancarado. Fechavam a janela e se recompunham de forma que ninguém soubesse que esteve visitando o óbvio. Mas ela, a óbvia, sabia. De alguma forma tinha consciência que eles vinham, liam. E por instantes até gostavam, sentiam a mesma coisa. Quando acabavam a leitura ou quando o último acorde de alguma música findava, suspiravam e se recompunham. E exclamavam: "Quanta obviedade!" E repetiam para si mesmos: "Jamais serei assim. Não sou assim." Certa vez ela leu em algum lugar que quando se repete diversas vezes algo, mesmo que mentiroso, torna-se uma verdade inabalável. Era a vez dela dar seu sorriso de canto de boca e fazer a feição de nojinho. Ela sabia que não era assim. E os "certos" sofriam. Sabiam que, secretamente, eram óbvios, também.

A música óbvia da moça óbvia:



A leitura óbvia da moça óbvia:

14 comentários:

rose marinho prado disse...

Já faz uns4 anos viraram a dizer que Renato Russo é uma PORCARIA.

Precisa contextualizar, música pop, brasileira, década de 80.

Eu, vc, temos gostos, sabemos o que é a mesmice, o que sai dela. Mas o que me intriga é a demonização ou esculhambação de um artista, assim, meio orquestrada.

Donde parte? Por quê?

O rock de 80 no Brasil foi um revival da Jovem Guarda , um tanto mais abusado, com músicos melhores. Mas estamos no Brasil. E havia o fim da ditadura, fez-se o que deu. Não foi um Cleiton e Cledir,,,né?
A gente precisa se libertar, gostar do que quiser, criticar e amar. Isso que vc faz. Não é execrar, isso é coisa de adolescente, né, Marie.

Às vezes tenho medo de escrever - olha o q escrevi hoje - assim, experimentando. Medo da minha crítica. Eu me massacrando.

Liberto-me e ninguém mais me pega. E como fui oprimida pelos amiguinhos da década de 70. Era vassoura de tudo que é lado. Os politizados me cobravam , os porralocas me cobravam , estes , o esoterismo e roupas de farpas.
Bem, estou ficando velha. Vem outra véia criticar minha tatuagem imaginária...rá rá rá..saio rindo.

Madame Min disse...

Marie!

Devidamente psicografado de mim.

Ou do poste da porta da sua casa até o poste da porta da minha, formou-se de repente um 'fio' condutor...

Linda, como sempre.

Beijo da sua amiga óbvia,

Min

Marie Tourvel disse...

Isso, Rose. Há alguns anos dizem que o Renato Russo de amado virou uma caricatura da depressão. E isso é falado por depressivos não-conscientes, que fique bem claro. É o clube, a confraria dos quais falo. ;) Definitivamente não foi um "coisas de magia, sei lá", foi bem mais que isso. Uma geração, a dos 80, sem muito objetivo, sem muito senso comum, mas ainda assim em busca de algo que não se sabia ao certo.
Sim, Rose, gostar do que quiser é importantíssimo. Por muitas vezes brinco com a breguice dos bananeiros, mas converso com uma amiga que me intima a escutar "Outra Vez" do Rei. Acho a letra linda e sinto que é meu momento, mas ainda considero o Rei breguésimo. Eu, num show dele? Nunquinha.
Esse nosso medo de escancarar nosso gosto é lamentável e faz parte de nossos momentos medíocres, isso sim. O medíocre não é gostar das letras de Renato Russo, mas dizer aos membros do clube que considera pobre porque dá um ar blasé.
Por aqui, Rose, querida, não verás a crítica. Aqui você pode ser porra louca, politizada ou simplesmente nada. Este espaço é aberto a quem quiser se manifestar. Eu só recomendo aos novatos que não sujem meu tapete, pois embora ele esteja com plástico, não tive grana suficiente para comprar um plástico potente. ;)

E velha, minha amiga? O que é mesmo ser velha? Eu, por exemplo, nasci velha para muita coisa e me orgulho disso. Somos duas velhinhas dançando ao som de "Será" ou mesmo cantarolando Franz Ferdinand. E somos jovens, também, porque ainda somos imaturas para muita coisa.

Acho que nem eu entendi muito bem algumas coisas que escrevi neste comentário-resposta, mas no final dá tudo certo, né?

Beijos

Marie Tourvel disse...

Min, minha querida amiga óbvia, ser óbvia não é para qualquer um. Somos iluminadas. ;)
Eu tinha certeza que iria se identificar porque somos assim, lugar-comum. Mas obviamente apaixonadas. ;)

Beijos e muita saudade de você. :)

Anônimo disse...

Às vezes ser óbvio é tão sábio!...
Simplicidade virou coisa vergonhosa.
obvialidade também.
Mas ninguém deixa de respirar, comer, ingerir líquidos, digerir tudo isso, dormir, prá sobreviver.
Não é óbvio?
Como não ser óbvio?
Se somos o tempo todo....

Marie Tourvel disse...

Barbara, querida (sim, fui visitar seu blogue antes de responder. E gostei. ;) ), em certas ocasiões, ou mesmo na maioria delas, o melhor é ser óbvio, ortodoxo mesmo. Mas para os "certos" torna-se vergonhoso esse lugar-comum. Se escovam os dentes, porque é óbvio, eles têm que fazer com certo estilo, seja lá o que for isso.
Adorei sua visita. Volte mais vezes, aliás, volte sempre, obviamente. ;)

Beijos da Marie

Ricardo António Alves disse...

Na mouche.
Marie, vai lá, que tenho algo de que você gosta.
Um abraço.

Anônimo disse...

:)


Beijo.

Marie Tourvel disse...

Opa, RAA, querido, já estou indo agora para aquele espaço tão gostoso. :)

Beijos!

Marie Tourvel disse...

Anônimo, querido, adoraria que você fosse você. Você é quem eu estou pensando? Se for, milhões de beijos e acho que a gente um dia vai conversar sobre tudo isso, não vai? Diz que sim, diz que sim... ;)
Se não for quem eu estou pensando... enfim, um beijo pra você, também. :)

Anônimo disse...

o mais das vezes o óbvio é difícil enxergar, bonjour marie

Marie Tourvel disse...

Quincas, querido, concordo com você, mas confesso que, apesar de óbvia, por muitas vezes tenho uma grande dificuldade de enxergar o óbvio. E saio machucada. Sempre.

Eu fico muito feliz quando vem por aqui. ;)

Bisous et bonjour

ana v. disse...

Deixa os certos com as suas certezas, Marie. Tudo inveja... óbvio!

Beijo :-)

Marie Tourvel disse...

O único problema, Ana, querida, é que tem um "certo" que eu simplesmente adoro. Mas sei que ele é óbvio, também. Só falta enxergar. ;)
Saudades de você.

Beijos!